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MENSAGEM Nº     106,    DE  28  DE     DEZEMBRO      DE 2018.

Senhor Presidente da Assembleia Legislativa,

No exercício das competências contidas nos artigos 42, § 1º, e 66, inciso IV, da Constituição do Estado, comunico a Vossa Excelência que decidi vetar integralmente o Projeto de Lei nº 376/2015, que “Dispõe sobre o atendimento diferenciado para pessoas com diabetes na rede estadual de saúde”, aprovado por esse Poder Legislativo na Sessão Ordinária, dia 21 de novembro de 2018.

Instada a se manifestar, a Procuradoria-Geral do Estado opinou pelo veto total ao projeto de lei:

“(...) ainda que munida de elevados propósitos, percebe-se que a proposta legislativa em comento contém vício de inconstitucionalidade formal,  na medida que disserta sobre aspectos gerais acerca da temática de maneira diversa do que consta na legislação federal sobre o tema.

Com efeito, o artigo 24, incisos V e XII, da Constituição Federal, estabelece a competência da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar concorrentemente sobre “produção e consumo” e sobre “proteção e defesa da saúde”, de forma que a atuação legislativa do Estado está circunscrita pelas balizas estabelecidas nos §§ 2º e 3º dispositivo, cabendo à União estabelecer normas gerais, e aos demais entes federados, o exercício da competência complementar.

(...)

Cabe ressaltar que a Lei Federal nº 10.048/2000 concede prioridade de atendimento, dentre outras, às pessoas com deficiência, que, dependendo do caso concreto a ser definido de forma técnica por equipe médica capacitada, podem estar incluídos aqueles acometidos por diabetes, de forma que confere tratamento amplo em relação à matéria da proposição analisada.

Essa mesma prioridade também está prevista, de forma muito mais extensa, no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015), na seção denominada “Atendimento Prioritário”.

O próprio Estatuto supracitado, em seu artigo 2º, define que “considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.

Desse modo, dadas as características do caso concreto, a serem avaliadas por especialista técnico, e desde que possua impedimento de longo prazo  que possa obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, a pessoa acometida por diabetes já estaria abarcada pelos diplomas legais supracitados. Dessa forma, tal como já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal na ADI nº 3645/PR, in casu, não se vislumbra qualquer particularidade ou peculiaridade local que justifique o tratamento da temática no âmbito do Estado de Mato Grosso de maneira diferente da legislação federal, que, ao seu turno, trata de maneira exaustiva a temática, não havendo conteúdo a ser supletivamente regulamentado pela legislação estadual.

Logo, nesta perspectiva, entende-se que o projeto de lei em análise excursiona sobre normas gerais, caracterizando notória usurpação da competência da União para legislar sobre a presente demanda, que requer o tratamento uniforme em todo o País, o que também faz ensejar afronta ao pacto federativo (art. 1º e 18 da CF/88).

Ademais, no que tange aos hospitais públicos e particulares, as clínicas e os postos de saúde credenciados à rede estadual de saúde, mencionados no artigo 1º da propositura, é desaconselhável que a lei defina critérios para prioridade de atendimento, haja vista que ser atendido de forma prioritária em estabelecimento de saúde implica avaliação técnica prévia de equipe médica, que avaliará a urgência e as peculiaridades de cada caso, seguindo os protocolos de acolhimento e avaliação de risco definidos pelo Ministério da Saúde.

Noutro giro, ainda que se entendesse que a competência para minudenciar a matéria estaria também reservada aos Estados, ao impor a obrigatoriedade ao Estado de, nos estabelecimentos de saúde sob sua responsabilidade, afixar cartazes, em local visível, contendo o texto da lei proposta e zelar pela sua aplicação, fica caracteriza ingerência indevida em tema afeto à organização e ao funcionamento de órgãos da Administração Pública Estadual, produzindo- se regras de cunho materialmente administrativo, cuja faculdade para deflagrar o competente processo legislativo é atribuída ao Governador.

Isso porque, para que o dispositivo da proposição seja  efetivado, é evidente que o Poder Executivo precisará, dentre outras providências, realizar a devida reorganização administrativa, além de remanejar verbas orçamentárias para arcar com os custos da afixação dos cartazes, além de alocar servidores e criar mecanismos para fiscalizar a correta aplicação das determinações contidas na lei proposta.

Mesmo sem especificar órgão ou secretaria que deverá cumprir as determinações previstas no projeto, o diploma legal em questão menciona estabelecimentos públicos de saúde, do âmbito estadual, o que, na prática, possui o mesmo efeito, criando obrigações e atribuições para a Administração Pública Estadual, que, provavelmente, serão cumpridas e operacionalizadas pela Secretaria de Estado de Saúde, alterando seu funcionamento e sua autonomia organizacional.

(...)

Logo, constata-se que a proposta, ao impor deveres ao Estado, também está eivada de vício de inconstitucionalidade formal, pois seu respectivo processo legislativo foi iniciado por autoridade sem competência para a matéria, qual seja a Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso, e, conforme os dispositivos constitucionais citados, incorreu em violação de faculdade constitucionalmente atribuída ao Chefe do Poder Executivo (art. 39, par.  único, II, “d”, e art. 66, V, ambos da CE/MT).

Em casos como esse, o Supremo Tribunal Federal vem, reiteradamente, declarando a inconstitucionalidade de normas análogas, por reconhecer o chamado vício de iniciativa (ADIsnºs1809/SC, 2.857/ES e 2.329/AL) (...)

(...)

Ante ao apresentado, forçoso reconhecer que o Projeto de Lei nº 376/2015, ao impor deveres cuja execução exige dispêndio de verbas públicas e mobilização da máquina pública, não versa unicamente sobre criação de política pública, mas sim sobre o estabelecimento de ações concretas a serem realizadas pelo Poder Público, o que equivale à prática de ato de administração, incidindo em indevida ingerência no funcionamento e organização da administração estadual, ferindo o princípio da separação dos poderes previsto na Constituição Federal (art. 2º).

Quando, a pretexto de legislar, o Poder Legislativo administra, editando leis que equivalem na prática a verdadeiros atos de administração, viola a  harmonia e independência que deve existir entre os poderes estatais.

(...)”

Essas, Senhor Presidente, são as razões que me levaram a vetar o Projeto de Lei nº 376/2015, as quais ora submeto à apreciação dos membros dessa Casa de Leis.

Palácio Paiaguás, em Cuiabá,  28  de  dezembro  de 2018.